domingo, 31 de janeiro de 2010

DO AVESSO



A história da humanidade é marcada pelo inevitável confronto dos opostos. Isso não é nenhuma novidade, é assunto mais do que debatido. Claro / Escuro, Rico / Pobre, Homem / Mulher, Palmeiras / Corinthians, em suma, “tudo comporta o seu contrário”, como disse o inigualável Mário Quintana.
Desde os pensadores gregos, passando por Hegel e concluído por Marx, o pensamento dialético é a mais perfeita e real forma de análise e tradução da sociedade. Tese e antítese resultam em uma síntese. Assim foi que da relação senhor / servo resultou a atual forma de produção econômica, caracterizada pelo inconciliável embate entre Capital/Trabalho.
Questão menos comum no debate dialético é a definição de qual seria o oposto do sentimento a que chamamos Amor. Muitos, de forma precipitada e simplista, responderão que é a raiva ou algum sentimento derivado dela como o ódio, a irritação ou a fúria.
Contudo, cumpre esclarecer que a antítese do amor nada mais é do que sua ausência, o não-amor ou o desamor. “O oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença”, concluiu Érico Veríssimo. Assim, fica evidente que o desprezo é a verdadeira contradição do amor. A raiva é, antes, o amor em potencial. Quantos casamentos são frutos de antigas e aparentes inimizades? Sentimos raiva de alguém que amamos, mas que, por exemplo, teima em manter-se em rota de autodestruição ou simplesmente discorda de algo que julgamos indispensável.
O desprezo é o vácuo, deserto, vazio. É sorrir diante do noticiário, são os “vidros a prova de gente” nos semáforos fechados, jogar papel em via pública, acreditar na compra da justiça social com o pagamento de impostos, é o preconceito, o monólogo, a novela, o paradigma inquebrantável, o corporativismo (ou qualquer outro “ismo” que prefira a ideologia a uma vida) é, por fim, entre outras coisas, ignorar o canto de um pássaro em um jardim, mas parar instantaneamente diante do som de uma moeda ao chão em plena Avenida Paulista.
É por desprezo que países como Somália, Ruanda, Angola e Haiti foram (e continuam) psicologicamente apagados do mapa. Por ele (desprezo) esquecemos nomes, datas e fatos; jogamos bombas atômicas em cidades e aviões em prédios; tomamos os fins pelos meios e a todo pela parte, perdemos uma alma gêmea.
Nós, os seres vivo mais “evoluídos” do Planeta, devemos eliminar a sociedade da indiferença, afinal, como ensinou Sérgio Buarque de Holanda “a história jamais nos deu o exemplo de um movimento social que não contivesse os germes de sua negação”. Neguemos a indiferença com muito amor e busquemos urgentemente a síntese dessa dicotomia.